Harris
et al. (1992) foi o primeiro a declarar que a ingestão de creatina
monohidratada poderia aumentar as reservas de creatina muscular (creatina e
fosfocreatina). Neste estudo, a ingestão de 5g de creatina quatro a seis vezes
por dia durante alguns dias aumentou a concentração total de creatina numa
média de 25 mmol/kg d.w., em que 30% do aumento do conteúdo de creatina foi na
forma de fosfocreatina. Os autores sugeriram que esses aumentos poderiam
melhorar a performance dos atletas em exercícios, mas não testaram esta
sugestão no referido estudo.
O
primeiro estudo de performance foi conduzido por Greenhaff et al. (1993). Os
sujeitos ingeriram 20g/dia de creatina durante 5 dias, e, de facto, a creatina
melhorou a sua performance em 6% durante séries repetidas no exercício extensão
do joelho para 1RM. Após este estudo, foram realizados mais estudos para
investigar as diferentes formas de exercício (Balsom et al. 1993ª, 1993b; Birch
et al. 1994; Harris et al. 1992; Voltek et al. 1997). Em 1999, dos 62 estudos
laboratoriais realizados sobre suplementação em creatina e performance em
exercícios de alta intensidade, 42 relataram efeitos positivos, e os restantes
não obtiveram efeitos significativos (Williams et al. 1999). A partir daí, o
número de estudos positivos foi-se acumulando.
Regimes de carga (loading)
Grande
parte dos estudos usou um regime de saturação com 20g/dia de creatina em quatro
porções, cada uma dada em diferentes partes do dia, por um período de 6 dias.
Este regime tem demonstrando que aumenta a concentração de creatina no músculo,
cerca de 25 mmol/kg d.w. Este aumento corresponde a aproximadamente 20% da
concentração basal de creatina no total na massa muscular, que é cerca de 125
mmol/kg d.w. Hultman et al. (1996) descobriu que, após uma fase inicial de saturação
de 20 g/dia por 6 dias, uma dose subsequente de 2g/dia é o suficiente para
manter uma concentração total de creatina alta por 35 dias, enquanto que parando
com a suplementação de creatina após 6 dias causa um processo lento e gradual
de declínio da sua concentração muscular.
Quando
a creatina foi ingerida numa dose de 3 g/dia, a taxa de aumento da creatina
muscular foi correspondentemente mais baixa, mas, após 28 dias de ingestão de
3g diariamente, a concentração total de creatina foi semelhante ao regime de rápida
saturação (20g/dia durante 6 dias seguido de uma fase de manutenção). Portanto,
a dose de saturação de 20 g/dia por 6 dias seguido de doses de manutenção de 2
a 3 g/dia é aconselhada se os atletas pretenderem aumentar a creatina muscular
para níveis máximos rapidamente, enquanto que uma dose contínua de 3 g/dia leva
ao mesmo nível máximo em cerca de 1 mês. O aumento da concentração de PCr é cerca
de 40% do total da concentração de creatina nos os dois processos.
Existem
variações consideráveis entre sujeitos na concentração inicial total de
creatina no músculo. As razões para estas variações são amplamente
desconhecidas, mas poderão, pelo menos, ter a ver com a habitual dieta de cada
um. O maior aumento na concentração de creatina muscular é observado em pessoas
com menor concentração inicial, enquanto que naqueles que já apresentam uma
concentração elevada de creatina muscular apenas beneficiam ligeiramente
(Harris et al. 1992). Uma concentração de 160 mmol/kg d.w. parece ser a
concentração máxima de creatina alcançável através de suplementação, mas apenas
20% dos sujeitos conseguiram chegar a estes níveis.
Os
níveis de aumento da concentração de creatina musculares podem ser ainda
maiores (aumentar em média 30 a 40 mmol/kg d.w.) quando a creatina (20 g/dia
por 5 dias) é ingerida numa solução com hidratos de carbono simples (Green et
al. 1995, 1996). Num estudo, a concentração total de creatina muscular aumentou
na maioria dos sujeitos até perto do limite superior de 160 mmol/kg d.w.
Pensa-se que a ingestão de hidratos de carbono estimula a captação da creatina
pelo músculo através de um mecanismo dependente da insulina. A insulina pode
estimular a atividade da bomba de sódio e potássio e, assim, o transporte de
creatina muscular.
Num
estudo de Casey et al. (1996) as mudanças de performance estavam relacionadas
com as mudanças do teor total de creatina muscular. Uma forte correlação foi
observada nas pessoas que mostraram os maiores aumentos na concentração total
de creatina muscular, e ainda apresentaram os maiores benefícios na
performance. Diz-se que é necessária uma mudança no conteúdo de creatina no
músculo de 20 mmol/kg d.w. para se observar mudanças significativas de
performance. Cerca de 30% de todos os indivíduos não apresentaram os tais
grandes aumentos da creatina muscular, e portanto não beneficiaram deles.
Ganho de peso
A
suplementação em creatina (20g/dia por 5 a 6 dias) é geralmente acompanhada por
um aumento de 0,5 a 3,5 kg de massa corporal. A média destes incrementos é
cerca de 1 kg. Teoricamente, este aumento da massa corporal e possível mudança
da composição corporal resulta do acréscimo de água intracelular, da
estimulação da síntese proteica, ou da diminuição da quebra de proteínas.
Devido à diminuição na produção de urina em paralelo com o curso do aumento da
concentração de creatina, a creatina causa provavelmente retenção de água nas
células musculares esqueléticas, uma vez que há um aumento da osmolaridade
intracelular nas fibras musculares. Algumas evidências sugerem que algum do
aumento ganho em massa corporal pode ser atribuível ao efeito anabólico da
creatina (Kreider et al. 1998), embora a curto prazo (5 a 6 dias) este efeito
não seja um fator importante.
Exercícios de alta
intensidade
As
descobertas de Greenhaff et al. (1993), que usou exercícios intermitentes de
alta intensidade, têm sido repetidas por outros investigadores usando
bicicletas ergométricas, supino, ou corrida como tipo de exercício. A maior
parte desses estudos (cerca de 70% de todos os estudos) demonstraram
melhoramentos na produção de força.
Balsom
et al. (1993ª) organizou aleatoriamente 16 sujeitos num grupo que suplementou
com creatina (25 g/dia por 6 dias) e num grupo placebo. Um teste realizado
pelos sujeitos foi o teste de sprintes repetidos, no qual fizeram 10 séries de
6 segundos de com descanso de 30 segundos entre cada uma. Embora os sujeitos se
sentissem fatigados a partir da sétima série, a fadiga foi significativamente
maior no grupo placebo. Casey et al. (1996) investigou o efeito da
suplementação aguda de creatina (20 g/dia por 5 dias) na performance numa
bicicleta isocinética (2 × 30 segundos com 4 minutos de descanso entre séries).
Foram observados aumentos no pico de potência e no trabalho total na primeira
das duas séries após suplementação com creatina. As melhorias na produção de
trabalho total foram positivamente correlacionadas com o aumento da
concentração de PCr nas fibras do tipo II após a suplementação.
Vários
estudos investigaram os efeitos da suplementação em creatina na performance de
nadadores de elite nos 25 m, 50 m e 100 m, em comparação com um grupo placebo
(Burke et al. 1996; Mujika et al. 1996; Peyrebrune et al. 1998). Estes estudos
não conseguiram demonstrar o efeito ergogénico da suplementação com creatina.
No entanto, dois estudos mostraram melhorias na velocidade de nadadores nos 10
× 50 m e nos 8 × 45 m (Leenders et al. 1999; Peyrebrune et al. 1998). Rossiter
et al. (1996) verificou um efeito ergogénico da suplementação em creatina na
performance de remadores competitivos nos 1000 m. Quando dois grupos de
jogadores de rugby receberam creatina ou placebo, não se observaram diferenças
entre os grupos (Chilibeck et al. 2007). O grupo que recebeu suplementação com
creatina aumentou o número de repetições nos testes de supino e prensa de
pernas, quando comparado com o grupo placebo.
Descobertas
sugerem que a creatina também melhora a performance nos exercícios de alta
intensidade em jogadores de squash
(Romer et al. 2001). Os jogadores fatigaram-se menos quando suplementaram com
creatina. Assim, a suplementação com creatina pode ter efeitos positivos na
performance de atletas nalguns desportos. Se a creatina tiver algum efeito,
este está dependente com as concentrações iniciais de creatina muscular, com o
tipo de exercício e o nível do atleta.
Exercícios de resistência
Nos
exercícios de resistência, muito do ATP é sintetizado na mitocôndria através da
fosforilação oxidativa. A quebra de PCr e a sua contribuição na produção de
energia é mínima. Mas a creatina e a PCr fornecem um sistema de transporte para
a transferência de grupos fosfato de alta energia do local de produção de ATP
(mitocôndria) para o local do seu consumo (miofibrilhas contrácteis). O grupo
fosfato do ATP produzido na mitocôndria é doado à creatina para formar
fosfocreatina. Da fosfocreatina, o grupo fosfato é doado ao ADP, é formado ATP
e pode ser usado para a contração muscular. Teoricamente, a creatina pode, no
entanto, facilitar a produção de energia e aumentar a performance no exercício
prolongado.
Balsom
et al. (1993b) investigou o efeito da suplementação com creatina por 6 dias na
performance em exercícios de resistência em corredores bem treinados. Não houve
nenhum efeito na corrida até à exaustão numa passadeira rolante em laboratório,
mas verificou-se uma diminuição significativa na performance durante a corrida
de 6 km. Os sujeitos demonstraram um aumento na sua massa corporal de 0,5 a 1,0
kg, que possivelmente explica o resultado negativo durante a corrida. Noutro
estudo, 5 dias de suplementação com creatina (20 g/dia) não teve influência na
captação de oxigénio, nas trocas gasosas respiratórias e na concentração
sanguínea de lactato durante um exercício de ergómetro de intensidade submáxima
e progressiva e durante a recuperação. Estes dados parecem sugerir que a
disponibilidade de creatina e PCr não é limitante da taxa de difusão de grupos
fosfato de alta energia através do citosol e que a suplementação em creatina,
portanto, não apresenta nenhum efeito no metabolismo muscular em exercícios de
resistência. Os estudos que têm investigado a suplementação de creatina na
performance em exercícios de resistência genericamente não reportaram efeitos
ergogénicos.
Treino de resistência
Vandenberghe
et al. (1997) investigou o efeito da creatina sobre a concentração de PCr
muscular, força muscular e composição corporal após um programa de 10 semanas
de musculação. Comparando com o grupo placebo, a força máxima dos grupos
musculares treinados aumentou 20% a 25%, a capacidade de exercício intermitente
máximo dos músculos flexores do cotovelo aumentou 10% a 25%, e a massa isenta
de gordura aumentou 60% com a suplementação de creatina. Este estudo e outros
sugerem que a combinação da ingestão de creatina com o treino de força é mais
eficaz do que apenas o treino de força. Em adição, Wagenmakers (1999) sugeriu
que a suplementação com creatina permite mais repetições e, assim, uma melhor
qualidade de treino ao mesmo tempo que pode promover um efeito anabólico.
A
creatina causa retenção de fluidos, o que pode resultar no inchaço das células
musculares. O inchaço celular atua como um sinal anabólico universal, causando
um aumento na síntese proteica e deposição de proteína (Lang et al. 1998).
Embora vários estudos sugiram que a ingestão de creatina tem um efeito
anabólico, não há evidências em indivíduos saudáveis que indiquem que a
creatina afeta o metabolismo proteico.
Mecanismos de ação
Vários
mecanismos pelos quais a creatina exerce o seu efeito têm sido propostas:
- A explicação mais óbvia é o aumento disponibilidade de PCr, particularmente nas fibras musculares do tipo II (Casey et al. 1996). Evidências indicam que maiores reservas de PCr no músculo melhoram a função contráctil mantendo o turnover de ATP.
- Outro mecanismo possível é o aumento da taxa de ressíntese de PCr (Greenhaff et al. 1994), que é particularmente importante em períodos curtos de recuperação durante sérias repetidas de exercícios de intensidade máxima.
- O uso aumentado de PCr como fonte energética pode reduzir a glicólise anaeróbica e a formação de ácido láctico. Esta atividade podere teoricamente reduzir a formação de iões hidrogénio no músculo e atrasar a fadiga causada pelo aumento da acidez muscular.
- A creatina pode isolar alguns iões hidrogénio produzidos durante exercícios de alta intensidade. Este processo atrasa a fadiga em exercícios de alta intensidade que é limitada pela formação de ácido láctico.
- A creatina têm um papel importante no transporte de grupos fosfato de alta energia do local de produção de ATP (mitocôndria) para o local de consumo de ATP (miofibrilhas). Este papel da creatina foi sugerido como um potencial mecanismo para a melhoria da performance em atividades de resistência. Mas este tipo de atividades não é afetado pela suplementação de creatina, sugerindo que este mecanismo não é importante.
- A creatina pode ter propriedades anabólicas.
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